A deficiência e a questão do direito ao trabalho
Autistas adultos ou adultos autistas?
Uma criança autista será um jovem autista que será um adulto autista. No percurso, poderão estar (ou não) reforços, trabalhos, terapias, acompanhamentos, etc. E um diagnóstico fechado, preferencialmente, escrito preto no branco e, onde, à luz da legislação nacional, se leia “deficiência neurológica”. Ou outra.
Porquê?
Porque, da mesma forma que temos medidas de promoção do sucesso em contexto de aprendizagem escolar que podem ser (e devem, se for caso disso), aplicadas, também temos o seu equivalente no mundo laboral. Para já, ainda não é uma questão sobre a qual eu me debruce muito, mas começo já a ter a noção do que podemos vir a esperar.
A deficiência e a questão do direito ao trabalho
Independentemente de haver ou não uma deficiência, há a questão do direito ao trabalho. E do desejo de querer trabalhar. Nada de errado nisso, é até muito louvável, tendo em conta a quantidade de jovens nem-nem (nem estudam nem trabalham) que temos em Portugal.
Há, igualmente, a questão do querer ser considerado e tido como igual aos demais na candidatura ou admissão ao lugar a que se concorre. O facto de haver o direito de se considerar uma percentagem obrigatória por lei para pessoas com deficiência – a tal “quota” -, não implica que se usufrua desse direito. Ou, e muita atenção a isto, esteja a ocupar um lugar de outrem. Eu sei que tenho direito a concorrer a nível nacional mas, por opção, não o faço. E, ao fazê-lo ou ao não o fazer, não estou a roubar o lugar a ninguém.
Faço-me entender?
Portanto, para que se clarifique um pouco a noção da “quota” ou do trabalhar, mesmo tendo uma deficiência: tal como se faz nas escolas, o que se deve fazer no local de trabalho é ter em conta algumas acomodações para a PcD (Pessoa com Deficiência), por exemplo, uma rampa, um elevador ou um local de trabalho ergonómico ou luzes de baixa intensidade ou uma área reservada para trabalho ou pausas para refeições em cantinas em horários desfasados ou possibilidade de usar abafadores de som ou esquemas visuais etc.
Claro que, tal como nas escolas, para que seja mais eficaz tratar desses recursos, é preciso haver um diagnóstico, preto no branco, ou um certificado multiusos que ateste a deficiência. Uma PcD não é incapaz de pertencer ao mundo laboral só porque tem uma deficiência. Mas, precisa – ou pode precisar –
de adaptações necessárias para ser tão – ou mais – produtiva que os seus pares (neuro)típicos.
O que considero ser mais justo – utópico, talvez? Espero que não… – é um maior entendimento da questão.
Se um autista vai trabalhar e precisa de acomodações necessárias, por que não?
Muitas vezes, nem sequer precisa de haver um investimento financeiro, basta alguma boa vontade pois a estruturação, a familiarização com o espaço (e o que é preciso fazer), o estabelecimento de uma rotina ou outros, já serão por conta do funcionário/empregado/colaborador (whatever que está na moda dizer-se agora).
Há uma relação estreita entre trabalho-produtividade-ambiente.
Ninguém é produtivo num ambiente desajustado. E, sob pena de se perder um excelente profissional, não atentando nesse grande pormenor, perde-se mais do que se ganha.
Deixo apenas uma reflexão em jeitos de conclusão sobre o direito e o desejo do trabalho: o meu professor de LGP é surdo profundo. E é professor e advogado. Ativista. E é um excelente professor e foi graças a ele que temos hoje, na grande maioria dos canais de TV, os intérpretes de LGP no canto da TV, no rodapé. Se concorreu à quotização de trabalhos ou não, não sei nem me interessa. Mas trabalha. E lutou pelas suas acomodações. E é um grande profissional.
É isto que eu quero para as minhas filhas. Porque, podendo ou não usufruir de tal, é um direito que lhes assiste.
O esforço de manter uma vida normal em tempos difíceis, a vários níveis… Em suma, uma aventura vivida a 4.