
As crianças só nos têm a nós. Sermos pais é uma longa jornada.
As crianças só nos têm a nós. Aos seus pais.
“Todos começamos esta viagem, cheios de sonhos, de esperança e de amor. Muito antes do mundo nos ensinar o medo temos momentos puros. Momentos em que os ratos são mais espertos que grufalos, vacas conseguem saltar luas e os gatos vivem em chapéus.” – Eric Christian Olsen
Todos nós nascemos livres. Seres cristalinos. Seres de amor. Puros. Com uma marca própria, uma assinatura única a deixar no mundo.
Depois, o ambiente que nos acolhe, os lugares onde nos movimentamos, as respostas que vamos recebendo às nossas necessidades e as nossas próprias vivências, vão marcando profundamente as fundações da nossa existência e conduzindo a nossa jornada.
O início da nossa viagem como pais não é muito diferente.
Antes de sermos pais, temos uma visão incrivelmente deslumbrante dos pais que vamos ser. Calmos. Pacientes. Controlados. Sábios.
E de repente… BOOM. Somos esmagadoramente abalroados pelo despertador da realidade.
Quando somos pais, é fácil sentirmo-nos arrebatados.
Triturados pelo medo. Ofuscados pela rotina. Confusos pela incerteza. Desgastados pelas noites sem dormir. Alérgicos com o chão por aspirar. De cabelos em pé com os brinquedos espalhados. Descompensados pelos Himalaias de roupa suja para lavar.
Porque que é que a roupa não se lava sozinha? E porque é que a minha filha não pára de chorar? Porque é que não come? Nem dorme? Porque é que não se veste sozinha? Mas não estava tudo bem agora mesmo? O que é que se passa?
Comecei a aperceber-me recentemente que sermos pais é assim como uma longa e surpreendente travessia de mota.
E consoante a nossa condução, assim as duas rodas nos vão respondendo. Consoante o estado da mota que conduzimos e as condições do terreno e do tempo, assim a nossa viagem por entre os desertos e os vales, as planícies e as encostas vai exigindo uma adaptação na nossa condução. Pode estar chuva. Pode estar sol. E quando chove, podemos sempre decidir se queremos levar o fato de chuva, se queremos seguir caminho ou se paramos um pouco, à espera que a chuva passe. Ou se avançamos mesmo assim e aproveitamos a aventura.
Apesar da nossa visão antes de sermos pais possa contrastar ofuscantemente com a realidade, no segundo em que escutamos, no momento em que prestamos atenção, em que nos conseguimos sintonizar com o grande esquema das coisas, conseguimos recordar o início da viagem. Sintonizar com a nossa visão. Com o nosso sonho.
E aí estamos prontos para dar um novo passo e reconectarmo-nos com o nosso ponto de partida.
Por vezes, encontramo-nos a navegar uma estrada oleosa, esburacada, cheia de curvas e contracurvas. Em rota descendente com curvas bem apertadas. Umas a seguir às outras. De repente, a gravilha no caminho parece ameaçar a resistência da nossa condução. O óleo da estrada ameaça fazer-nos tombar na próxima volta. Literalmente.
E os sonhos, a esperança e o amor que orientaram a visão inicial da nossa viagem parecem ser colocados à prova. Momento sim, momento sim.
As crianças só nos têm a nós.
Maya Angelou dizia que quando sabes melhor fazes melhor.
Com conhecimento adequado, podemos mesmo tornar-nos pais calmos. Mesmo quando estamos exaustos. Fora de nós. À beira de um ataque de nervos.
Por vezes damos por nós a ouvir a voz – uma ou mais vozes – tão longe no tempo, mas tão perto agora a ressoar dentro dos nossos ouvidos.
Damos por nós, aniquilados pela pressão, pelo stress, pelos eventos da vida, a fazer exactamente as mesmas coisas que sempre criticámos, a dizer aquilo que sempre detestámos e que jurámos a pés juntos que nunca iríamos fazer. Ficamos mal. Estamos a dar o nosso melhor com o que temos, mas cá dentro sabemos que podemos fazer melhor. Queremos fazer melhor.
A nossa intenção é a melhor. No entanto, parece que, por mais que queiramos, no momento, não conseguimos fazer de outra forma. E é na fragilidade, na vulnerabilidade, que o nosso piloto automático fica no comando. Apesar dele nos despertar aquilo que sabemos já não se coadunar com aquilo que queremos fazer, acontece. O piloto automático fica no comando. Recorremos ao que conhecemos. Ao nosso próprio padrão interno. Que na grande maioria das vezes é fundado no nosso estado de não- consciência.
Então, procuramos culpados, culpamo-nos a nós próprios.
Sentimo-nos incapazes. Um falhanço. Ficamos zangados, frustrados.
Falamos em tom de guerra quando sentimos que as nossas próprias necessidades não são satisfeitas. Mesmo que submersa na nossa intenção resida uma mensagem de paz.
Aprendi que não importa o que a vida nos atire, temos sempre a possibilidade de escolher. E nem sempre fazemos a escolha mais adequada. Apesar de toda a nossa boa intenção.
No entanto, temos sempre a possibilidade de fazer uma escolha consciente do passo que vamos dar a seguir. Da forma como vamos falar. O que vamos dizer. O que vamos fazer.
Sermos pais é uma longa jornada.
Que não tem de ser penosa. Terá sempre muitos desafios, é certo. No entanto pode ser uma jornada simples. O que não quer dizer o mesmo que fácil. Mas simples.
As crianças só nos têm a nós.
Aprendi que somos os adultos responsáveis pelo seu crescimento e desenvolvimento saudável. Não apenas físico, mas muito mais importante que isso. Temos uma grande responsabilidade no seu desenvolvimento emocional.
Recentemente vi um vídeo em que o realizador americano Mark Webber, entrevistado pela sua mulher Teresa Palmer, conta que a sua mãe o sentava e incentivava-o a dizer: Eu amo-me. Nessa altura, Mark e a sua mãe viviam em estado de extrema pobreza, navegando de refúgio em refúgio num dos mais violentos e pobres bairros de Filadélfia. Em situação extrema, esta mãe tinha consciência do quanto aquele exercício poderia semear no coração do seu filho segurança. Força. Esperança.
Ao longo da nossa viagem por esta estrada desconhecida a forma como reagimos à chuva, às tempestades, às curvas apertadas, tudo isto determina a nossa aventura.
Não é tanto a chegada ao destino, mas a proeza da viagem.
É necessário um profundo investimento na preparação e uma desperta libertação de toda a nossa formatação interna.
Se ajustamos a nossa condução à mota que temos, se decidimos desacelerar ou até mesmo ir parando simplesmente para observar a beleza da paisagem, depende apenas de nós. Ao contrário, se decidimos acelerar correndo o risco de sermos obrigados a travar de repente e sofrer um acidente, depende apenas de nós. Se decidimos dar um pontapé no pneu porque a mota tem um furo ou porque deixa de trabalhar porque nos esquecemos de pôr gasolina. Se chamamos nomes à chuva porque decidiu cair no dia em que planeamos sair. Também depende de nós. Não da mota. Não da estrada. E com certeza não da chuva.
Muitos de nós crescemos numa sociedade de julgamento. A maior parte de nós ainda se move em ambientes assim. De buscar no exterior por responsáveis pelas contingências da vida. Mas isso não poderia estar mais longe da verdade. Muito menos no que toca às crianças.
Como adultos, nós somos os primeiros agentes emocionais das crianças.
Somos os agentes da construção do diálogo interno com que as crianças crescem e se desenvolvem.
Quando imaginamos ser pais, por vezes ainda muito novos, somos guiados pela nossa visão. Mas tal como em todos os sonhos, é necessário dedicação, treino, empenho e trabalho árduo contínuo e permanente para concretizar a nossa visão. Para se materializar o que sonhámos. No entanto, não se aprende empatia na escola. Nem gestão de emoções no liceu. Nem conexão na Universidade. Precisamos de uma melhor preparação para o nosso papel de pais. Não uma preparação apenas em relação às necessidades exteriores (de sede, de fome, de conforto) mas tanto ou muito mais revelantes: as necessidades emocionais.
Estarmos preparados para as adversidades, para aprendermos e adaptarmo-nos a uma nova linguagem é condição fundamental em qualquer viagem. Quando mais preparados estivermos para as condições adversas que possamos encontrar, quanto mais dispostos e abertos estivermos, melhor nos conseguiremos adaptar e reajustar a forma como solucionamos ou superamos os momentos mais difíceis.
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