
pai divorciado
Carta de um pai divorciado
Carta de um pai divorciado
Não foi isto que eu sonhei. Sei que o cenário do vestido branco e da festa é uma representação maioritariamente feminina. Talvez seja uma imposição cultural. Como homem, também tive os meus sonhos. Sei que posso ser um pouco conservador (às vezes os meus amigos chamam-me “careta”) mas tenho legitimidade para sonhar. Não tenho?!
Sonhei com um casamento para a vida. Pronto, já disse. Sonhei que íamos ao jardim das estrelas do nosso entendimento. Sonhei com passeios à beira mar em tardes de cinema. Passeios sempre com a temperatura amena. Brisas afáveis e doces, partilha e entendimento.
Sonhei com a concórdia na educação dos nossos filhos. Idealizei uns sogros que ajudavam.
Mas as coisas não foram assim.
Quando recebi a primeira carta do tribunal, já tudo me parecia um pesadelo. Hoje, já não me custa como no primeiro dia. A dor mudou. A dor está diferente. A dor piorou. É quase insuportável.
O pai só não pode amamentar! De resto podemos fazer tudo.
Claro que há pais que não são assim. Conheço demasiados maus exemplos. Mas eu sou diferente!
Quando recebi a segunda carta do tribunal, já nem era eu. O solavanco, as mentiras, as acusações, a maré negra de sentimentos a matar os sonhos. Quero educar os meus filhos. Estou sozinho nesta luta. Até a minha mãe diz que “os filhos são das mães”. Das mães? Os filhos são do mundo! Estou errado? Hoje sou pai em dias alternados. Há a guarda partilhada dos afetos. Há esta expressão sem sentido.
Suponho que tenhas receio que não os saiba educar. Suponho que a advogada te aconselhou mal. Suponho…e custa-me tanto. Quero ser pai a tempo inteiro, quero voltar a sonhar. Posso?
Nem quero acreditar no que me dizem. Algumas das pessoas que me rodeiam falam na hipótese de manipulação da tua parte. É verdade? Eras capaz de manipular os nossos filhos?
Espero que consigas rodear-te de amigos verdadeiros. Amigos capazes de alertar, caso comeces a falhar.
Lembro-me que os psicólogos em Portugal, uma das primeiras intervenções que tiveram, foi exatamente nas questões do divórcio. Só que isto foi há 20 ou 30 anos! Agora, no século XXI ainda há quem instrumentalize as crianças? Ainda há quem ache que a razão está só de um lado? Agora faz algum sentido, eu dar comigo a pesquisar por “Richard Gardner”? Levo os nossos filhos para férias e sinto a condescendência das pessoas. “Ai tão lindo, o pai a tratar deles todos” “Que corajoso, um pai sozinho com tantas crianças.” “Quer ajuda? Onde está a sua mulher?” E as “partilhas de amigos” que fizemos? Muitos ficaram do teu lado.
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Um divórcio, como uma guerra, como um jogo em que todos perdem, como um sonho morto por ordens do tribunal, como um sonho morto por dias alternados, por manipulações mesquinhas, e pior, um sonho morto por nos esquecermos das crianças!
Tento arranjar desculpas para o teu comportamento. Afinal, vivemos tanto, partilhámos tanto. Chegámos a amar-nos, não foi? Hoje já ponho tudo em causa. Às tantas não namorámos o suficiente e casar foi precipitado.
E tento arranjar desculpas…és insegura, a tua mãe é controladora…
De que adiantam as desculpas se os nossos filhos sofrem? Precisamos de ajuda. Precisamos de alguém que nos ajude a ver a situação em perspetiva. Alguém sensato. Vamos procurar? Foi um pesadelo. Ainda acordo a pensar nisto. Penso que estás deitada ao meu lado. Penso que não tenho que fazer contas aos dias, para saber se os vou buscar. O meu coração de pai não tem hora nem calendário.
Não tenho vergonha de dizer, a surpresa foi grande. Notava alguma fragilidade na nossa relação. Seria do excesso de trabalho? Sentia divergências na forma de educar. Seria do excesso de esforço, do excesso de leituras? Nós queríamos fazer tudo bem. Afinal, falhámos. Falhámos.
Pelo menos eu falhei, pois não foi isto que sonhei. Vamos tentar não falhar mais? Para o bem dos meus filhos? Melhor, vamos tentar não falhar mais, para o bem dos nossos filhos. Vamos?
A criação do Mundo Brilhante permite-me visitar escolas de todo o país e provocar os diferentes públicos para poderem melhorar. Agitamos. Queremos deixar marcas.