
Carta de uma mãe apaixonada
Quando eu tinha 7 anos a minha mãe esperava-me sempre ao final do dia no portão da escola. Duas vezes por semana íamos a pé até à baixa para eu ter aulas de solfejo. Nesses dias ela esperava-me com um copo de leite morno com chocolate que me dava energia para a caminhada. Ainda hoje quando bebo leite com chocolate àquela temperatura fecho os olhos e recordo-me da mão da minha mãe na minha pelas ruas da cidade…
No verão, quando as férias chegavam, íamos sempre em família dar uma volta à feira de Santiago e quando voltávamos a casa, eu estava tão cansada que mal conseguia manter os olhos abertos. Nessa altura, a minha mãe deitava-me na cama, vestia-me o pijama e passava uma esponja húmida sobre os meus pés empoeirados antes de me dar um beijo de boa noite. E eu achava que aquela esponja só podia ser mágica para me fazer sentir tão bem.
No tempo frio a minha mãe aconchegava-me à cama para se certificar que só a minha cabeça ficava a descoberto. E então levantava o colchão de lado e em baixo para melhor prender os lençóis e os cobertores enquanto eu me imaginava num barco no meio de uma tempestade em alto mar.
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E disso também nunca mais me esqueci.
Olhei para ti enquanto brincavas. Tentei recordar-me de mim própria quando tinha a tua idade e todas as memórias me levaram à minha mãe. A minha mãe era uma boa mãe. Talvez na altura eu não tenha tido a capacidade para perceber o alcance destes pequenos gestos mas hoje, a esta distância, sei ver tão bem o quanto ela me amou a vida toda e que estes eram gestos de amor maiores que o tempo que me separa deles.
Gestos de amor que guardarei para sempre no meu coração.
Olhei para ti enquanto brincavas, e perguntei-me que gestos de amor meus levarás para a vida. Serão feitos de sabor a chocolate, do toque de uma esponja ou do aconchego de uma cama? Olhas para mim e eu sorrio. Devolves-me o sorriso e continuas a brincar. Não sei que memórias guardarás dos teus 7 anos, da tua infância ou da tua mãe.
Mas como sei que este meu sorriso embevecido nunca seria capaz de disfarçar o amor que sinto por ti, tenho a certeza que pelo menos esse levarás contigo. Bem guardado na memória do teu coração.
imagem capa@dengodefeen
Adorei ler este texto porque, para além de ter sido filha, também sou mãe e avó. Tive uma infância super feliz e desde pequena que dizia: “gosto tanto da vida que quero ter muitos filhos para eles poderem saber como é bom viver”! Acho que a minha infância foi feliz porque, na realidade, estes pequenos-grandes gestos de Mãe e/ou Pai, embora não fossem uma constante diária eram bastante assíduos. Aquela sensação de que “someone cares for you” era mesmo fantástica e, no entanto, nada controladora. Ora, o truque era mesmo esse. Amor, afectividade e companheirismo. Claro que havia também a autoridade parental mas nós sabiamente conseguíamos “cozinhar” todas essas vertentes. Lembro-me, já com 19 anos de idade, depois de ter estado a estudar fora durante dois anos, no dia seguinte à minha chegada a casa dos meus pais, a minha mãe me trazer o pequeno-almoço à cama…. Fiquei mesmo “desvanecida” com o seu desvelo e pensei: “estive 2 anos fora, a estudar e a fazer tanta coisa sozinha e agora a minha Mãe chega aqui com estes miminhos como se eu ainda fosse criança”….. mas, no fundo, gostei muito daquele gesto de amor que, de entre muitos, ainda me lembro com uma eterna saudade……
Tive a enorme sorte de, juntamente com o meu marido, ter construído uma família sólida e feliz (tal como eu, em criança, tinha idealizado). Três filhos muito autónomos, responsáveis e que se sentem bem na sua própria pele. E, de repente, a família começou a crescer, a crescer, a crescer e já vamos em 12 netos – em vésperas do nascimento de uma 13ª neta…. Afinal o meu sonho realizou-se! Espero que um dia os meus netos continuem a transmitir aos seus filhos esse legado especial e intransmissível que se chama Amor. A vida torna-se infinitamente melhor e mais fácil.
Linda declaração de amor à mãe e à filha 🙂