Crianças, pais e terapeutas
Apoiar os pais, manter a confidencialidade e a parceria com os nossos pacientes, colocar limites, dizer a verdade sem magoar, colaborar para alterar dinâmicas não nutritivas da sistémica familiar, são algumas das inúmeras questões que se colocam todos os dias a quem trabalha com crianças e adolescentes.
Quase sempre quando vou receber pais, dou por mim a pensar como é que vou transmitir aquilo que o filho sente, sem trair a sua confiança e sem magoar os pais. Por vezes os diagnósticos são mais complicados ou sou portadora de notícias devastadoras como automutilações, abusos ou ideações de suicídio.
Fico sempre, como terapeuta, como pessoa e como mãe altamente em compaixão por aquela família.
Para mim compaixão é estar com a pessoa na sua paixão/dor. Procuro ser sincera, verdadeira, transparente e com todo o meu amor porque só acredito nesta tríade dessa forma.
A verdade é que quando atendemos crianças ou adolescentes não podemos nunca esquecer que estamos a lidar também com a família e esse é um enorme desafio para mim e com certeza para as famílias. Costumo dizer que sou apologista da psicologia da verdade, seja lá o que isso for!
Nem sempre as famílias estão preparadas para essa verdade. E nem sempre nós sabemos ao certo o que é deles, o que é nosso ou o que é da relação que temos mantido com a família. É difícil escrever isto, mas é a mais pura verdade. Transferência e contratransferência connosco, com os próprios e também com a família…. Empatias, afinidades, capacidade de compreensão, tudo entra nesta relação que tem momentos mais fáceis de gerir do que outros.
Ser terapeutas e ser mães
Já estive do outro lado. Como mãe. Com o meu filho mais selvagem e sei bem o que é ouvir o que não queremos. Ler tudo aquilo de que queríamos fugir. Mas sei também o quanto é reparador e regenerador para nós, para o próprio e para toda a família enfrentar e encontrar formas de transformar! Para mim essa é a palavra que me traz esperança a e convicção….
Acreditar que podemos sempre transformar e converter todos os aspetos que no momento são difíceis e provocam bloqueios que conduzem à terapia, em aspetos positivos.
Acredito na transformação. E acredito sempre nas capacidades das crianças e dos jovens. Acredito sempre na capacidade da família em se reorganizar, alterando padrões por vezes muito enraizados mas muito pouco nutritivos.
A empatia com as famílias
Também acontece depararmo-nos com famílias com as quais não conseguimos mesmo estabelecer empatia. Com as quais parece que todas as nossas palavras esbarram como se de uma parede de tijolo se tratasse. Sentimos que vai ser muito difícil evoluirmos me conjunto. Nesses casos, para além da reflexão que retiro para mim própria e que me ajuda a crescer como pessoa, julgo que o próprio universo se encarrega de os levar para outros terapeutas, para outras pessoas que terão a habilidade de trabalhar com aquela família e naquela conjuntura.
Na verdade não acredito em técnicas, acredito em relações, em vínculos…. Isso sim é o mais difícil de estabelecer. E é uma maravilha quando conseguimos na gestão intensa que esta tríade, terapeuta, paciente e família trazem consigo, e que fazem do nosso dia-a-dia puras lições de amor por nós próprios e pelos outros….
Considero a psicoterapia como uma ferramenta fundamental no desenvolvimento pessoal, na qualidade de vida e de relação com os outros. A psicoterapia é para todos e não apenas para alguns.