É possível fazer mais pela escola pública
Sempre que ouço falar em projetos que ousam reinventar o ensino, mais acredito na necessidade de um ranking que sirva para valorizar as escolas inovadoras. Sobretudo se esse desejo de inovar servir para satisfazer uma vontade aflita, teimosa, da escola em cumprir a sua utilidade, como aconteceu em Estremoz.
Descobri a Secundária Rainha Santa Isabel pelo livro “A Escola” de Paulo Chitas, um ensaio cuidadoso sobre o caminho que um conjunto de professores, pais e alunos percorreu no combate ao insucesso escolar.
O projeto surgiu no ano letivo 2002-2003, em resultado da inquietude de Teodolinda Magro, confrontada com a persistência dos maus resultados entre os alunos do 7º ano.”A única medida que existia para lidar com a perda de motivação deles era a repetição, o chumbo.” Determinada a provar que é sempre possível “aproveitar mais um aluno”, e sabendo que a composição das turmas era a razão da continuidade de maus resultados na escola, a professora expôs ao conselho executivo e a alguns colegas mais próximos, o plano que desenhara para recuperar os alunos em perigo de reprovação. “Eles não eram capazes, sozinhos. E um dia percebi que eles só eram capazes se fossem tirados dali. Se não os deixasse começar a fazer as coisas habituais. Precisava de os tirar de lá.” E tirou-os. Para a Turma Mais.
Ainda hoje a escola pratica com êxito o modelo de agrupar alunos numa turma extra, de acordo com o seu nível de desempenho. Durante 45 dias, dois professores em regime de codocência prestam apoio individualizado e centrado nas necessidades específicas do grupo. Fazem-se novas amizades.
A Turma Mais permite aos estudantes o direito a um período de recobro em que se minimizam assimetrias e compensam dificuldades pela poderosa cura do ensino refletido, planeado à medida da realidade. Os alunos voltarão à turma de origem já em condições de prosseguir as aprendizagens, numa lógica de igualdade que a ninguém abandona e a todos beneficia.
O tema intimida, não é confortável. Se nos apercebermos da relação existente entre os baixos recursos das famílias e a falta de rendimento escolar, diria que envergonha.
Esta mudança aconteceu à força dos muitos porquês que interrogam a desmotivação para o estudo. Cerca de 50% dos alunos que a secundária Rainha Santa Isabel recebe, é oriunda dos concelhos mais próximos cuja realidade socioeconómica impõe reflexão. Porque há envelhecimento, porque há desertificação, porque há franca diminuição do poder de compra. Porque o transporte disponível para quem vem de longe, deixa os miúdos na escola todas as manhãs às 7:15, quando a primeira aula começa às 8:30. Porque como estes casos há outros espalhados pelo país, muitos, perante os quais a escola não pode ficar alheia.
Teodolinda percebeu em boa altura que um aluno com mau desempenho urge ser tratado com melhor ensino. Que carregar nos ombros o peso do chumbo só o vai fazer parar mais vezes pelo caminho, levar o dobro do tempo, ficar pela metade.
A escola devia obrigar-se a fazer o contrapeso necessário para resgatar os alunos deste ciclo árido, infecundo, que os impede de evoluir, como faz Estremoz. Lá, as verdades simples são as primeiras a defender-se, até fora das muralhas: eles sozinhos não são capazes.
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1 comentário
Parabéns Teodolinda! Adorava saber mais sobre o projeto Turma Mais! Parece uma iniciativa muito bem pensada e sucedida!