Castigo ou ConsequĂȘncia?
Existe diferença?
O âcastigoâ faz parte do processo educativo de qualquer criança.
Ă fundamental a criança perceber que, quando faz algo que quebra as regras sociais impostas pela cultura e pelos pais, estas açÔes tĂȘm de ter uma repercussĂŁo. Essa função serve para que ela possa apreender o que deve e pode, ou nĂŁo deve e nĂŁo pode fazer, sempre com a finalidade de vir a sentir-se integrada na sociedade enquanto adulta. Mas serĂĄ que a palavra castigo terĂĄ realmente este valor na cabeça de uma criança em formação?
Quando nos debruçamos sobre o valor linguĂstico da palavra castigo deparamo-nos com o seguinte significado:
âpunição que se inflige a um culpado; mortificação, tarefa penosa ou grande dificuldade; dar castigo; punir; obrigar (fonte: in DicionĂĄrio Priberam da LĂngua Portuguesa, 2008-2013) que, por si sĂł, Ă© jĂĄ penoso e negativo.
A criança sabe que a mĂŁe, o pai ou o educador a vai pĂŽr de castigo se fez algo negativo e errado, sendo que na cabeça de muitas crianças isso atĂ© pode ter um efeito aterrador, potenciando a mentira como um fator de fuga ao castigo (se eu nĂŁo disser que tive mĂĄ nota, nĂŁo irei ser castigado, por exemplo). Contudo, se usarmos a palavra consequĂȘncia, encontramos como significado: âresultado natural, provĂĄvel ou forçoso, de um facto; dedução tirada por meio de raciocĂnio de um princĂpio ou de um facto; conclusĂŁo dimanada das premissas; [Figurado] importĂąncia, alcance (fonte: in DicionĂĄrio Priberam da LĂngua Portuguesa, 2008-2013) que tem um valor mais educador, construtor, digamos assim, potenciando a aprendizagem.
Castigo ou ConsequĂȘncia – O peso da palavra
O valor e o peso da palavra tĂȘm muita importĂąncia no entendimento do significado da mesma, ainda mais para uma criança. Dito isto, a utilização da palavra consequĂȘncia cumpre mais o objetivo jĂĄ referido, fazendo com que a criança aprenda que o que acabou de fazer nĂŁo estĂĄ certo, por forma a que ela nĂŁo volte a realizar a mesma ação, apreendendo a razĂŁo pela qual nĂŁo deve voltar a fazĂȘ-la. Assim, a palavra consequĂȘncia, porque se alia a coisas mais construtivas, permite Ă criança sentir que para qualquer situação hĂĄ consequĂȘncias, positivas e negativas, com as quais ela tem de lidar, enquanto que o âcastigoâ tem um valor muito limitado porque a criança nĂŁo reage por compreensĂŁo mas sim por medo.
Uma criança em situação de castigo nĂŁo reflete, apenas reage emotivamente e sente a reação do castigador (zangado, furioso, chateado…).
Por isso, o castigo nĂŁo pode atuar adequadamente, porque nĂŁo exige entendimento. Em vez de se âcastigar âdeve-se levar a criança a sofrer as consequĂȘncias do seu agir percebendo o que a levou a cometer a ação, e permitir-lhe um movimento de reparação. Pedir desculpa ou consertar o que estragou podem ser medidas eficazes, nĂŁo culpabilizam e aliviam a criança da pressĂŁo do ato. Em suma, queremos acima de tudo que a criança compreenda o que fez e porque nĂŁo deve voltar a fazer, nĂŁo apenas que ela tenha medo da consequĂȘncia, sem refletir sobre o que fez.
O envolvimento dos pais ou educadores
HĂĄ contudo um pormenor que pode ou nĂŁo ajudar a criança neste processo construtivo. A existĂȘncia ou nĂŁo de uma relação/disponibilidade entre a criança e o adulto. Para que a criança consiga fazer este percurso de entendimento das consequĂȘncias das suas açÔes, o adulto tem de estar em relação com ela, demonstrando disponibilidade afetiva e capacidade de empatia.
E isto porquĂȘ?
Porque, muitas vezes, quando um adulto atribui uma consequĂȘncia negativa, essa consequĂȘncia vai refletir apenas uma defesa do adulto face ao que tem de investir na relação com a criança ou adolescente. Ou seja, muitas vezes a tal consequĂȘncia Ă© mais uma reação de raiva ou frustração do prĂłprio adulto face ao acontecimento, sendo atĂ© muitas vezes desmedida essa reação. E, quando isto acontece, quando os adultos atuam sob o sentimento da raiva ou da vingança pela impotĂȘncia que sentem face Ă criança ou adolescente que desautorizou ou infringiu alguma regra, ele passa a estar presente na vida da criança, mas de forma negativa. Isto porque ou a ignoram ou reagem de forma desmedida.
Chamadas de atenção
Certamente que jå observaram a cena em que adultos se divertem e conversam, esquecendo-se das crianças ao lado. De repente uma criança parte algo para chamar a atenção dos adultos.
Esta ação inconsciente da criança (fazer uma asneira como chamada de atenção) na verdade, pretende castigar a atitude dos adultos que a ignoraram. Tal como um objeto que a criança partiu para reclamar atenção do adulto, também o comportamento indesejado, por exemplo mentir, roubar, fazer xixi na cama, agressividade entre outros, tem sempre motivos inconscientes (pese embora a noção de que essa mesma asneira tem um objectivo concreto na cabeça da criança).
Ă fundamental que o adulto esteja disponĂvel para perceber por que a criança teve uma reação descontextualizada.
Se nĂŁo estiver disponĂvel, a consequĂȘncia nĂŁo tem o seu valor, a criança nĂŁo aprendeu nada e o adulto lavou as mĂŁos. NĂŁo se envolveu. E passa uma mensagem de desamor, o que pode ter  consequĂȘncias catastrĂłficas para a vida social futura da criança. NĂŁo se pensa, apenas se reage ou age! E como podemos pedir a uma criança que consiga controlar o seu comportamento, quando o adulto nĂŁo o consegue fazer? Ă igualmente importante refletir sobre o facto de o mais forte levar o outro apenas a calar-se mas sĂł depois de ter perdido a razĂŁo. Passando-se, assim, a uma nĂŁo relação.
A palmada na hora certa
DaĂ a ideia de que, muito embora possamos naturalmente dar uma palmada (refiro que jamais uma chapada, porque tem um peso ofensivo e pessoal) em situaçÔes em que a criança se comporta de forma desadequada, na verdade nĂŁo Ă© elemento fundamental Ă educação de uma criança. Podemos, e atĂ© arrisco dizer que devemos, educar sem usar a força fĂsica e naturalmente a verbal.
As crianças refugiam-se no seu cativeiro da imaginação, da solidão e reagem segundo a sua personalidade e a sua relação com os educadores.
O amor e a estima, são fundamentais para toda a educação, e são muitas vezes ignorados.
Castigo ou ConsequĂȘncia?
O amor e a admiração adquirem-se por identificação e nĂŁo por consequĂȘncias. O educador que dĂĄ consequĂȘncias de forma desmedida e nĂŁo explicada, nĂŁo sabe amar nem serve de modelo positivo para que a criança tenha um crescimento mental saudĂĄvel. Nestes casos acontece muitas vezes que a adoção de regras e limites se façam por interiorização e imitação das atitudes e dos valores de um outro que nĂŁo o educador, de uma figura de referĂȘncia mais prĂłxima, pais, educadores, professores, Ădolos da juventude, entre outros.
Se os adultos, pais ou educadores tĂȘm atitudes repressivas em vez de educativas, atĂ© podem conseguir resultados, mas serĂĄ sempre pela via do medo (castigo), onde a criança tem medo de perder o amor do adulto e reprime o comportamento. Torna-se pois, fundamental, mudarmos de paradigma. Ă necessĂĄrio abandonar os modelos de educação pela força, pela lei do mais forte! Ă urgente educar num ato construtivo positivo. Educar pela compreensĂŁo e pela atenção e disponibilidade interna dos educadores para escutarem ativamente as crianças e os seus apelos!
Acima de tudo, educar com amor e humildade.
imagem@vix
Revisto por Babelia TraduçÔes para Up To KidsŸ
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