Ao pai dos meus filhos, um estranho na pele de família: eu não estou zangada contigo. Estou triste por ti. Estás a perder tudo.
Olhei para ti quando, de coração nas mãos, te entreguei os miúdos que não vias há mais de um mês, e lembrei-me de como tu és. Olhei para ti, e vi o vazio nos teus olhos. O mesmo vazio que sempre vi, e tentei preencher comigo, com o meu amor, com os nossos filhos.
Percebi pela rouquidão da tua voz a quantidade de cigarros que deves ter fumado na noite anterior. Percebi que te sentias mal, que tinhas passado o dia a dormir e que estavas para morrer. Percebi que não era boa ideia cumprires a tua obrigação de passar o fim de semana com os miúdos. Cheiravas a álcool, a ressaca, e só me lembrava de te ver assim todos os fins de semana durante anos.
Senti o coração no estômago por deixares que os miúdos te vejam assim, e por ter de deixa-los contigo nesse estado. A memoria trouxe tudo ao de cima.
Sorri-te como se estivesse tudo bem, e fingi não perceber o que se passava. Perguntei se estava tudo bem. Disseste que sim, mas eu sabia perfeitamente… Não estava nada bem.
E estás a perder tudo.
Era suposto seres o homem. O homem que eles admiram. O homem que eles querem ser quando crescerem. O homem que os ensina a ser um homem. O homem em quem eles podem confiar. Mas não és.
Sim, eles adoram-te. E neste momento eles até olham para ti. Mas não estás a ser um exemplo, e de certeza que não podem confiar em ti.
Mandaste-me uma mensagem nessa noite, apenas algumas horas depois de eu ter saído. E eu sabia aquilo que te recusaste a admitir.
“Eu sei que não vais querer saber, e que provavelmente irás usar esta mensagem contra mim de alguma forma, mas estou farto de vomitar e de suar. É um bocado assustador, e não, não estive a beber”
Eu sei que estavas mal e a ressacar. Tinha percebido horas antes. Não foi a primeira vez e não será a última. Na verdade até fiquei aliviada por teres mandado mensagem. Mesmo que não tenhas admitido a verdade sobre a tua “má disposição”, eu fiquei contente por ir buscar os meus filhos e leva-los para casa. O meu instinto materno dizia-me que eles estavam a precisar da mãe, e que tu não estavas em condições de passar o dia com eles. Por isso obrigada por teres assumido que não conseguias aguentar até à hora de jantar. Mesmo que não admitas qual o verdadeiro motivo.
Eu já não estou zangada contigo. Pelo menos como costumava estar. Agora é a desilusão que me assola cada vez que estou contigo.
Eu sinto pena por ti, e pelas pessoas que acreditam nas tuas mentiras.
Adorava que fosse diferente. Mas já desliguei.
Não queria que te afastasses dos rapazes, mas a verdade é que já o fizeste.
Enquanto passas o tempo, que deverias estar com eles, a beber, eu aproveito e desfruto cada minuto das suas companhias. Enquanto destróis tudo à tua volta, eu ensino-os a consertar e construir coisas.
Enquanto dormes a aconchegar a tua ressaca, eu aconchego os nossos filhos.
Enquanto sais com outras pessoas, eu também saio. Com três outras pessoas, para ser mais precisa. A diferença é que eu estou nestas relações para toda a vida, e as tuas duram uma noite.
Enquanto inventas desculpas, eu estou a criar memórias.
Estás a perder tudo.
Quando estás com eles, perdes tempo a mandar-me sms a contar as suas piadas e saídas humorísticas, e esqueces-te que eu estou com eles todos os dias.
Eu sei que eles são espetaculares.
Ficas surpreendido com coisas que eles dizem e fazem e contas-me como se fosse novidade para nós os dois. Eu sei que eles são espertos. Eu é que lhe ensino as coisas que eles sabem.
Ficas surpreendido quando os vês abraçados um ao outro muita cumplices. Eu sei que eles são carinhosos. Eles aprenderam a gostar intensamente, comigo.
Enquanto vives de volta do teu umbigo, perdido nesta vida que tanto dizes adorar, estás a perder tudo.
Não sabes que o Ethan gosta de ser empurrado muito alto no baloiço, mas que tenho de fazê-lo de frente para que consiga sempre ver a minha cara.
Não sabes que o Connor também gosta que o empurre, mas só devagarinho, porque alto é assustador para ele.
Não sabes que eles já se vestem sozinhos, mas que o Ethan veste primeiro os braços e depois a cabeça, e o Connor faz exatamente ao contrário.
Não sabes qual a refeição preferida deles, ou a música preferida ou o jogo preferido. Não sabes que eles os três adoram dançar. Não sabes que o Luke tem tanto de selvagem e forte como de doce.
Não sabes que o Connor se esconde quando está envergonhado.
Não sabes que eles querem jogar futebol e que são bons de bola. E provavelmente não vais estar lá nos treinos, nem tampouco nos jogos. Sou eu que vou estar lá a apoiá-los. É a minha cara que vão procurar no meio das bancadas. Não sabes como ensiná-los a serem cavalheiros, porque tu próprio ainda és um miúdo mimado.
Estás a perder tudo.
Quando eles nasceram o meu mundo mudou. O teu continuou igual. Perdeste a beleza do que é ter filhos e nunca compreendeste o quão importante era o teu papel. Nunca quiseste na verdade assumir esse papel. Mas quiseste ser pai, e agora estás a perder tudo.
Eu já não estou zangada contigo.
Estou triste por ti.
Porque tu estás a perder tudo.
Eu não.
Por Rachael Boley, para Scary Mommy; tradução e adaptação autorizada para Up To Kids®
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