“ Eu não quero crescer!
Quando crescemos tornamo-nos “maus”, deixamos de ser inocentes. Olho para o meu primo de 2 anos e fico triste de pensar que ele, coitado, vai crescer. Eu detesto fazer anos…estou quase a fazer 16 anos, e estou a crescer e é horrível!!”
Quando estas inquietações invadem a mente de uma adolescente, como armas perfurantes que picam e cortam um futuro que se desejava sonhador e brilhante, quase perdemos a fala e nos rendemos ao eco ensurdecedor de uma existência dilacerada e incompreendida. O que a I. me trouxe na forma de embrulho amachucado, escondendo uma angústia dolorosa não é novo. Infelizmente o medo de crescer tem invadido os gabinetes de consulta entre os mais pequenos e os “quase adultos já não crianças”.
“ No outro dia fui tomar café com a minha mãe e as amigas dela a um barzito/discoteca e de repente ela começou a dançar!! A dançar!! Eu passei-me e disse: O que é que tás a fazer?? – Estou a divertir-me!! (respondeu a mãe) – Mas os pais não se divertem. Os adultos não se divertem, pára com isso!”
Que imagem estaremos nós a dar aos nossos filhos? Às nossas crianças? Que reflexo é este que os faz temer o seu amanhã e desejar regredir a uma dependência imatura, protectora e desajustada, como quem teme um bicho papão que nada nem ninguém deterá?
De alguma forma fica latente a ideia que andamos a alimentar “lobos maus” e “bruxas más” na nossa sombra, que nos acompanha passo a passo dentro e fora de casa, que leva à escola, dá banhos, come à mesa e (com sorte) se senta na beira das suas camas.
E explorando um pouco mais a imagem que a I. tem dos adultos, surge um reflexo gritantemente depressivo e exasperado que os adultos são “despejadores de zangas e frustrações”. A I. está longe de ser a única a expor esta hodierna concepção dos adultos que somos. Infelizmente tenho encontrado todo um abecedário que de olhos lacrimejantes e baços, espelham o medo e a incompreensão dos “lobos maus” que saíram dos livros e do imaginário e ganharam forma na realidade diária. Dos professores, aos pais, passando pela família, esse mundo dos crescidos outrora aliciante é hoje visto como uma gigantesca caverna escurecida e fria, da qual não há retorno.
E por outras linhas, já meias tremidas e apagadas é certo, podemos perceber que ser crescido parece, hoje, bem mais do que aniquilar a criança e jovem que fomos, é padecer de um mal no qual jamais cabe um sorriso que abrace, contenha e faça florescer a vontade de crescer.
Drª Joana Cloetens, Setúbal
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