Vou ser mãe de uma menina daqui a umas semanas. Tenho pensado muito sobre o futuro, como seria de prever. E mais ainda sobre o passado.
Nos últimos três anos na relação com o meu marido tenho dado comigo a repetir alguns dos aspectos negativos da relação que vi os meus pais terem ao longo dos anos. É certo que me conheço bem e que me é mais fácil olhar para o que é negativo do que o positivo. Sem dúvida, muito de bom aprendi porque senão não seria a pessoa equilibrada, corajosa e humana que creio ser hoje mas a realidade é que me tenho confrontado com partes de mim que sempre me recusei a vir a ser um dia.
Ok, ok, em termos intelectuais e muito racionais e até lógicos lembro-me de, desde muito nova, ter decidido “Nunca vou repetir isto ou aquilo”. Recusava-me veemente a ser submissa e ser aquilo que via como desrespeitada. E que choque tem sido, depois de tantas vezes ter debatido estas questões com amigas ao longo dos anos, ver-me igual. Ver-me ser filha da minha mãe. Ou filha de muitas mães e mulheres cujo comportamento fui assimilando.
Orgulhosamente filha da minha doce mãe, com um coração de ouro e que mostrou como se comporta uma pessoa compassiva. Filha da minha mãe que me mostrou integridade e verticalidade. E, depois outras coisas que por hábitos de gerações e gerações de mulheres têm vindo a repetir-se e tão mal me sabem na boca e no coração. Nas veias.
O que me levou a escrever este texto agora, foi o facto de acreditar que nos esquecemos facilmente da dificuldade que implica mudar hábitos antigos. Antigos meus, antigos da minha mãe. E antigos de tantas outras mulheres. Leio muitas vezes artigos sobre as coisas que NÃO devemos repetir. Que vamos ser diferentes. Mas pouco sobre a pujança feroz da repetição de comportamentos, irracionais, instintivos e enraizados. Quando me vi em situações, que não me orgulho, por revelar uma autoestima menor do que mereço. Porque sei que sou uma mulher “a sério” e merecedora do maior respeito e fiquei triste comigo. Porque temos ideias do que podemos e queremos ser.
O que me importa neste momento não é que a minha filha veja a minha força e perfeição, mas que veja a minha vontade de me desafiar a seguir em frente e alcançar os meus objetivos. Não quero que ninguém à minha volta se sinta mal por cair. Por serem dominadas por padrões de comportamento antigos.
O que tem sido realmente bom é que, em momentos de dúvida, sobre se estamos certas ou erradas, há algo dentro de nós que sabe “isto não é certo PARA MIM“. E que, por mais vezes que repitamos maus hábitos que nos magoam e se espalham com tanta facilidade, todos os dias esta voz fica mais forte e acabamos por mudar. Acabamos por ser quem de facto queremos ser. E se insistirmos, mais cedo ou mais tarde, chegamos onde queremos.
Talvez me seja difícil pôr em palavras o desafio interno que se manifesta e transformar em acções que transformem o passado num novo presente. Mas vou tentar. Ainda que estes hábitos estejam tão enraizados e talvez me pudessem levar a calar-me e a não refutá-los, a minha voz faz-se, sempre, ouvir. Verbalizo o que sinto. Mostro a minha indignação. Tenho coragem de ser transparente e de mostrar quem sou. Agora falta-me a consistência de ser mais firme. De levar até ao fim a pessoa que realmente sou e criar uma verdadeira transformação. Por mim, pela minha filha e para criar novos ciclos de relações saudáveis e de companheirismo.
Estamos a caminho de um futuro melhor. De um futuro em que não ensino através das palavras ou conselhos, mas através de novos comportamentos. Sou filha da minha mãe. Mãe da minha filha.
Obrigada mãe pelo caminho que fizeste até aqui. Agora agarro eu.
Por Ana Calha, Blog Prá Vida Real
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