No amor só há bondade

No amor só há bondade

O mundo está desajustado às crianças. Por mais que na maioria das vezes se revelem mais sábias e maduras que muitos adultos, o mundo está formatado para servir os adultos. As suas vidas apressadas, as suas vontades, os seus desejos, as suas aspirações. E também as suas frustrações, as suas ansiedades, as sua insatisfações. E as crianças sofrem essa pressão – uma pressão que não é sua, nem sua de sofrer.

Os mais velhos exigem respeito mas não sabem ensiná-lo, querem apreciação, mas rugem ferozmente quando não sabem gerir os momentos menos bons dos seus filhos. E usam da voz – para fazer valer o seu estatuto, magoando e ferindo os seus pequenos corações que apenas pedem carinho, ensinamento e compreensão.

Há adultos em sofrimento permanente e outros a cometerem atrocidades por uma infância que lhes foi roubada em nome de um amor que não existe.

Porque no amor só há bondade.

O mundo está formatado para crianças obedecerem ou então serem julgadas, catalogadas ou envergonhadas por pais – e profissionais também – cheios de expectativas, sem paciência e – mais uma vez, cheios de pressa para  – tantas vezes – ir a lado nenhum.

Há quem acredite convictamente que é bom as crianças aprenderem, passando por más experiências – sob o argumento de que é assim que o mundo funciona e que vivemos em sociedade. Há também quem creia que devemos falar com as crianças em vários tons e de várias formas consoante o nosso nível de agrado perante uma situação ou comportamento. E nos temos de – e devemos –  zangar. Porque “só assim é que eles aprendem”.

Mais uma vez, no amor – na sua mais pura essência – só existe bondade. Nada mais. Quando passa a barreira da bondade, já é de outra coisa que se fala.

O amor não é castigador. O amor não manda. O amor não pune. O amor não rejeita. O amor não é egoísta.

O amor aceita, acolhe. O amor recebe. O amor é terno. Respeitador. O amor motiva, inspira. O amor abre espaço. Dá espaço. O amor dá tempo. O amor dá. Sem qualquer propósito de receber.

Criar é antes de mais acolher. É guiar. É ensinar. Mais ainda. É inspirar! É tornarmo-nos numa fábrica de sonhos, onde os nossos filhos possam aprender como é boa a vida, só porque esta manhã acordámos e ainda respiramos.

É sermos um lugar onde eles se podem resguardar do mundo, sem necessidade de sentirem que têm de lutar permanentemente por amor e aceitação. É terem em nós o seu porto de abrigo, é sermos a sua verdadeira e mais importante escola – aquela que forma as emoções e que inclui e aceita todos os sentimentos como parte integrante de cada um de nós  – sem excepção.

É terem em nós aqueles amigos – aqueles melhores e verdadeiros amigos – que estão lá para todos os maus momentos. E que escutam com o coração. Que abraçam. Que respeitem.

Muitos pais dariam a vida por mais um momento com os seus filhos. Filhos que perderam e não voltarão a poder abraçar.

Nós que temos a sorte – o privilégio –  de poder abraçar os nossos filhos sempre que quisermos, porque não o fazemos mais?  Nós que podemos escutar as suas vozes, porque não o fazemos mais? AMAR é ACOLHER. MIMAR. ATENTAR. RESPEITAR.

Charlie Chaplin dizia sublimemente que usamos o poder apenas quando queremos ou vamos fazer algo nocivo, prejudicial a outra pessoa. Caso contrário, o Amor é suficiente para que tudo se consiga.

No amor não há dureza. No amor só há bondade.

Porque na verdade, no final das contas, no final de cada dia, isso é tudo o que conta. Tudo o que resta. E, se pensarmos bem, é apenas disso que precisamos.

No amor não há dureza. Não pode haver. Se houver pode até ser outra coisa qualquer.

Mas não é amor.

imagem@free-fotos.gatag

M. J. Silva é autora dos livros Rich Parent, Poor Parent – Discovering Your Purpose, da série The Rich Parent, sobre parentalidade positiva.
Jornalista, investigadora área do desenvolvimento emocional

Para além de livros sobre parentalidade, escreve também romances e livros infantis. É uma forte activista dos direitos da criança e do fim da violência contra as crianças.

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