O lado bom dos gritos

O lado bom dos gritos! Afinal, porque é que é bom gritar?

O lado bom dos gritos!

Afinal, porque é que é bom gritar?

Gritos fortes à nascença são uma boa forma de garantir nota alta na primeira avaliação formal da vida, o índice de Apgar. Nos primeiros dias ainda achamos que os gritos são óptimos indicadores de vitalidade e personalidade no bebé. Este é o lado bom dos gritos. Mas há mais.

Gradualmente, o lado bom dos gritos vai desvanecer, e estes vão parecendo, cada vez mais, um problema. Se estamos na rua, num restaurante, numa loja ou em casa com uma valente dor de cabeça, os gritos já não são bem-vindos, e já não arrancam propriamente um sorriso do rosto dos pais. De repente, gritar não é assim tão bom e a situação tem que ser “controlada”. Começam então a accionar-se  os mecanismos necessários para ensinar a “arte” da contenção. Algo que muitos adultos conhecem de bem perto.

E é mesmo dos adultos que eu quero falar.

Actualmente, os pais vivem muito pressionados pelo politicamente correcto. Não se grita, não se bate, não se castiga. No entanto, vivem também “atropelados” por uma vida centrada em trabalho, filhos e nas dificuldades do dia-a-dia. O espaço para se viverem a si mesmos é reduzido ou inexistente e isso, tem consequências. Cansaço e frustração acumulados, interferem com a paciência e a disponibilidade mental. De repente, às vezes quase sem darem por isso, estão a gritar (seja sozinhos, com a “cara metade” ou com os filhos). Depois, aparecem o desconforto e a culpa de terem gritado, de terem perdido o controle, de não terem contido a sua zanga.

Primeiro, é preciso perceber porque é que gritamos.

Gritar é querer viver! Tal como o fazemos à nascença anunciando que chegámos para ficar, e que trazemos connosco força e desejo de existir e de conquistarmos o nosso espaço. É isso que as crianças fazem sempre que gritam, mostram-nos que estão ali, dispostas a lutar pela sua existência, pelas suas necessidades. É isso que nós fazemos. Gritamos quando sentimos que não temos espaço, que não estamos seguros, que não estamos a viver de forma equilibrada e plena. Gritamos para nos fazermos ouvir, para nos ouvirmos a nós mesmos. Serve, acima de tudo, como um alerta do género, “eu não estou bem, ok?”. A verdade é que gostamos de acreditar que gritamos porque nos ajuda a descarregar, mas se assim fosse, depois de o fazermos, sentir-nos-iamos melhor. O que não acontece…

Afinal, porque é que é bom gritar?

Porque ali, naquele momento, surge a oportunidade de olharmos para nós mesmos. Temos a oportunidade de perceber que algo está a retirar espaço em nós. E com isso, passamos a ter a possibilidade de transformar a situação. É preciso saber que o desejável não é termos pais que se conseguem conter no seu desconforto (até um dia…). O que se pretende, é que os pais não gritem porque estão suficientemente bem para não precisarem de o fazer (pelo menos não de forma sistemática).

Na realidade, eu diria até que são muitos os pais que estão a precisar de um bom grito de vida e de libertação.

Por outro lado, os gritos são bons na medida em que são verdadeiros. Põem à vista algo que é real e existe em nós, pais. E também não deixa de ser importante para os nossos filhos, conhecerem este nosso lado. Saberem que os pais também têm os seus limites. No meu entender, a luta que actualmente é travada contra os gritos, deve sim, ser redireccionada para os motivos que levam os pais a gritar.

E as razões podem ser muitas:

– Necessidade de mudar uma dinâmica familiar, em que as relações e os papeis se atropelam mais do que se entre-ajudam;

– Necessidade de mudar as práticas educativas, por não estarem a resultar positivamente para todos os elementos da família.

– Pode querer dizer que existe algo na nossa vida que devemos mudar, ou aprender a aceitar.

– Necessidade de auto-conhecimento ou de transformar algo em nós e na forma como nos vivemos a nós mesmos e às nossas emoções.

– De ganhar novos recursos de comunicação e/ou gestão da zanga e da frustração.

– Necessidade de nos sentirmos mais felizes.

Então… se andamos a gritar muito, o que devemos fazer?

Quando nos apercebemos que andamos a gritar muito, normalmente o que fazemos é tentar perceber o que é que se passa de errado com as pessoas à nossa volta, nomeadamente os filhos. Até porque é tão mais fácil dizer que os nossos filhos nos dão “conta do juízo”. Mas, na verdade, a solução está na maior parte das vezes em nós.

Mas não basta fazermos um esforço para parar de gritar com os nossos filhos.

É preciso, sim, olhar para as causas e intervir no que for necessário. Até porque muitos pais que “prendem” os gritos dentro de si, vêem depois os seus filhos gritar “desesperadamente” no seu lugar.

Ficam aqui algumas dicas:

– Conversar com os filhos sobre a situação

Vai ajudar a que todos voltem a estar em sintonia e a saber o que é que estão a sentir. Neste momento, será saudável um pedido de desculpas, que pode fazer sentido que venha de um ou dos dois lados – “Quero pedir-vos desculpas. Eu sei que a minha reacção foi muito exagerada. Gritei muito e disse-vos coisas de que me arrependo. Tive um dia mau. Vocês não paravam de discutir uns com os outros e eu, naquele momento, só consegui reagir daquela maneira. Agora estou mais calma e podemos falar…”.

– Tentar perceber a verdadeira razão  que está por detrás da situação (o estado emocional e a sua causa).

Faça uma revisão ao seu dia e tente perceber o que há de comum aos momentos em que “perdeu a cabeça”.

– Trabalhar os seus níveis de assertividade vai ajudar a que haja mais clareza na comunicação familiar, e a exprimir melhor o que sente, assim como as suas necessidades. Em simultâneo estará a dar espaço para que os seus filhos aprendam a fazer o mesmo.

– Iniciar os procedimentos para a mudança.

Considerando que os gritos não trazem benefícios nem para si nem para a relação, antes pelo contrário, prejudicam, deverá começar por procurar uma forma diferente de exteriorizar o que está a sentir. Muitas vezes passa por, em vez de começar a gritar, exprimir em voz alta o que está a acontecer consigo. Dar voz ao que o seu corpo está a sentir. “Hoje tive um dia mau, estou com dor de cabeça, e está a ser cada vez mais difícil para mim lidar com o barulho que estão a fazer”, por exemplo. Por um lado, estará a dar uma oportunidade aos seus filhos de perceber melhor a situação e de agir em conformidade, por outro, será mais fácil para eles lidar com uma explosão caso ela venha a acontecer e, finalmente, a exteriorização dos seus sentimentos ajuda a reduzir a tensão que estes lhe estão a provocar.

Quando menos esperava desatou a gritar desalmadamente com o seu filho?

Saiba que, desde que não permita que isso se transforme na sua forma de se comunicar e de se relacionar com os seus filhos, os “danos” não são irreversíveis. Pare, pense, sinta e aja. Não permita que os seus gritos sejam apenas ruído. Faça deles uma alavanca para a mudança!

 

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