O mundo parou. Como vamos vivê-lo e explicá-lo aos nossos filhos?
Estamos a viver um momento histórico na primeira pessoa. Algo parecido ocorreu há cerca de 100 anos e nós apenas ouvimos falar. Agora somos os protagonistas e não sabemos muito bem o que deve ser feito, nem o que dizer aos nossos filhos.
É sem dúvida um tempo em que tudo parece suspenso mas simultaneamente tudo tem que continuar e não podemos ficar de braços cruzados à espera que a desordem, o medo e a angústia tomem conta de nós. Temos que cuidar de nós e dos outros. E acima de tudo promover ambientes equilibrados para que consigamos pensar e agir corretamente neste momento de crise. É nesse sentido que pretendo deixar-vos algumas indicações que poderão ser úteis.
Estamos em estado de emergência e isso é novo para qualquer um de nós. Estamos a adaptarmo-nos e sobretudo a aprender a lidar com tudo o que nos rodeia de forma diferente. A saúde mental e o equilíbrio familiar não podem ser desvalorizados e devemos ter em conta algumas questões:
1.Protegermo-nos e protegermos os outros
Em primeiro lugar ter sempre presente e de modo consciente a importância de cada um tem na sua própria proteção e na proteção dos outros, seguindo sempre todas as indicações da DGS e dos canais oficiais.
2. Rotinas
Nestes dias que vamos estar em isolamento social é crucial criar rotinas. Estas são essenciais para que a “nova dinâmica” familiar seja positiva. Especialmente nos casos em que os adultos estão em teletrabalho e que desta forma acumulam as tarefas da alimentação e da ocupação dos filhos. Para alem disso as rotinas proporcionam uma sensação de segurança para os mais novos e para os mais crescidos (adolescentes) um maior senso de organização e responsabilidade.
3. Organização
A gestão das dinâmicas familiares e a criação de rotinas, devem ser feitas em conjunto de acordo com os hábitos, estrutura e recursos de cada família. O facto de terem horários pré-estabelecidos para refeições, estudo/trabalho, banhos e brincadeiras, vai fazer com que toda a família se possa organizar melhor e tenham momentos em conjunto de melhor qualidade.
4. Gerir emoções
Emoções como o medo e a tristeza são reações automáticas quando lidamos com algo que é desconhecido e incerto. Por isso é essencial que consigamos aceitar o que estamos a sentir e se achar necessário falar com profissionais sobre as mesmas. Outra forma de gerir as emoções nomeadamente o stress e a ansiedade que são comuns nestas situações, é evitar ler, ouvir ou ver noticias que o deixem ansioso ou angustiado, até porque muitas dessas notícias não são fiáveis. A constante atualização noticiosa pode criar preocupação, limite os tempos de informação e restrinja-se apenas aos comunicados oficiais.
5. Pensamento positivo
Neste contexto que estamos a vivenciar nem tudo é negativo, dedique tempo a observar o que de positivo se esta a passar à sua volta: mais tempo para si e para a sua família, a solidariedade aumentou, o planeta está menos poluído e já podemos ver mudanças significativas. Partilhe histórias e mudanças positivas.
6. Comunicação entre pais e filhos
Outra questão importante é a comunicação entre pais e filhos, esta é absolutamente indispensável, o que se está a passar deve ser explicado de forma clara e numa linguagem adaptada à idade da criança/jovem, mas acima de tudo, o discurso deve transmitir segurança e tranquilidade.
No caso dos mais novos, devemos convidá-los a falar acerca do assunto para que os pais ou educadores percebam de que forma está a entender o mesmo. Toda a informação que passar deve ser verdadeira e apenas o essencial. Por exemplo ao nível da forma como se podem proteger (lavagem das mãos, não dar beijinhos, etc.). Não devem entrar em detalhes para evitar ao máximo os medos e ansiedades.
Para os mais velhos (adolescentes) sendo que é cada vez mais difícil restringir o consumo de informação que vem das redes sociais e meios de comunicação, devemos alertar para o facto de que muita dessa informação não é fiável, é uma forma de os manter mais tranquilos.
7. Ler e comunicar
As restrições de contacto social devem ser mantidas com rigor por todos, no entanto é importante promover a interação com os amigos e familiares através do contacto telefónico ou por outras vias online. Sugere-se também que o tempo seja ocupado com a leitura, pois para alem do exemplo que estão a dar aos mais pequenos, podem assim alimentar a mente e o conhecimento. Várias plataformas disponibilizaram livros de leitura online gratuitamente o que é uma mais valia que pode ser aproveitada por toda a família.
8. Exercício físico
A prática do exercício físico diário e uma alimentação equilibrada também ajuda a manter o equilíbrio físico e mental e pode contribuir para uma dinâmica familiar saudável e equilibrada.
9. Tempo e espaço
Para alem dos momentos em conjunto é importante entender que cada um (adulto, criança, adolescente), continua a ter necessidades diferentes. Por isso é importante criar momentos em que cada um possa ter o seu próprio tempo, o seu próprio espaço.
10. Família
A família é considerada a instância social mais importante ao nível do desenvolvimento psicossocial do sujeito. Neste momento que somos desafiados a enfrentar o medo e a incerteza é primordial que se promovam as relações afetivas significativas e securizantes e neste momento é algo que pode ser feito a tempo inteiro.
Nunca a família nuclear esteve tão próxima para poder cuidar das necessidades de desenvolvimento da criança como:
- saúde (física e mental);
- educação (desenvolvimento cognitivo, desenvolvimento de habilidades e interesses, etc.);
- desenvolvimento emocional e comportamental (qualidade de vinculação, adaptação à mudança, resposta adequada a situações de stress, etc.);
- identidade (auto imagem, sentimento de pertença, etc.);
- relacionamento familiar e social (empatia, etc.);
- autonomia e competências parentais.
Para que isto seja possível sem que os adultos entrem em burnout são necessárias as regras, os limites e a rotinas que devem ser estabelecidas logo desde o início, para que todos saibam quando e como devem agir e que tarefas cada um deve cumprir.
Nada dura para sempre. Nem os bons, nem os maus momentos. Por isso tenho a certeza que apesar de não saber qual a duração da mesma, esta é uma fase passageira e por isso devemos aceitar este momento presente com serenidade e extrair dele as coisas positivas que conseguirmos.
Adepta da formação contínua, pois só assim me sinto actualizada e com mais competências profissionais, efectuei uma especialização na área da PlayTherapy (Terapia do Brincar), com a qual me identifiquei desde o primeiro dia e que muito me tem ajudado na prática clinica com crianças.