O que muda em três anos de vida

Meu amor, dentro de poucos dias farás três anos.

Parece pouco, mas olhando para trás é difícil imaginar como era a vida antes de ti.

Estes três anos foram repletos de aprendizagens, de mudanças, de adaptação.

Hoje já dormes a noite toda, mas demorou a chegares aqui. Usas fralda apenas para dormir e da chucha (que só usaste para dormir) nem sinal.

Apreendes o mundo à tua volta de uma forma que por vezes me surpreende, és capaz de fazer conversas e fazer as perguntas acertadas no momento propício.

Já me sabes pedir “só mais um bocadinho”, acompanhando com o gesto dos dedos quando é hora de ir para o banho, já sabes chamar a atenção quando alguém faz uma coisa que te ensinou a não fazer: como cantar à mesa.

Aprendeste a andar e és segura nos teus passos, nas tuas descobertas. No outro dia seguiste com o olhar o tronco de uma árvore e ficaste espantada por ver que acabava tão lá em cima. “Vai até ao tecto, mãe!”. Corrigi, dizendo que ia quase até ao céu e mostrei-te que as árvores, como as pessoas, existem de todos os tamanhos. E que o que importa é a sua beleza, o que as torna únicas. “E as formigas que lá dormem”, acrescentaste. És assim, vais começando a deixar-me sem palavras.

Percebes as diferenças entre ti e os que te rodeiam e aceitas os outros como são.

És refilona, chorona, coisa que até aos quase seis meses de idade não foste. Talvez tenha coincidido com o facto de entrares para a creche. Não te condeno por isso, eu própria preferia que as coisas fossem de outra forma, mas a entrada no infantário deu-te ferramentas e vivências que eu não conseguiria proporcionar-te. O amor, esse, não deixou de estar sempre presente.

Por falar nele às vezes falas comigo e chamas-me de “meu amor”, como te chamei e chamo tantas vezes.

Brincas com as tuas bonecas com menos paciência do que gostaria: ralhando, dizendo para pararem de falar, um ai ai ai ai constante – mais uma vez uma vivência que ganhaste na escola, que vês fazerem e por isso repetes – e que eu não me canso de tentar mudar.

Será uma aprendizagem lenta mas que irás adquirir, a de não fazeres aos outros aquilo que não gostas que te façam a ti. Pergunto: “gostas quando ralham contigo para dormires? Não, pois não? Então fala baixinho, conta histórias, faz carinhos. Estás em casa, és a mãe, podes fazer tudo. Escolhe fazer o melhor, meu amor”. Olhas-me com os teus olhos grandes e sei que alguma coisa fica lá.

Temos hoje de ter cuidado com o que se diz ao pé de ti, porque tudo registas e de nada te esqueces. Bastou a bisavó ter dito uma vez que não podia jogar contigo à bola porque era “velha” (e o que eu ralhei com ela por chamar nomes, principalmente a ela mesma…) para a partir daí nunca mais te esqueceres e associares esse adjectivo à bisavó. Começaste já a perdê-lo, com muita insistência minha. Quando falamos e mencionamos o teu nome ficas de antenas no ar: ”estão a falar de mim?”.

És autónoma e independente, mas muitas vezes não gostas de prescindir da companhia.

És uma péssima ajudante na cozinha porque comes metade dos ingredientes do jantar.

Ajudas-me a preparar o pequeno-almoço, o que te ajuda a valorizá-lo quando o comes.

Levantas sempre o teu prato e és tu quem o leva para a cozinha. Ajudas a pôr a mesa.

Já não gostas de comer de babete, mas a sopa na maior parte das vezes ainda o pede.

Muitas vezes pedes “quero ir dormir”. Mas sempre depois de uma história ou de uma música de embalar cantada ao ouvido.

Há três anos mal nos conhecíamos, apesar da ligação que sempre tivemos.

O pai saía de casa para o trabalho e eu trazia-te para a nossa cama e ficávamos a namorar até ser hora de levantar e irmos sentir o mundo, os seus cheiros, as suas cores e barulhos. Para que fizesses parte dele, para que eu não deixasse de fazer.

Parece que foi ontem e na realidade foi. Porque és capaz de todas estas coisas mas, no fundo ainda és um bebé. Que precisa de apoio, protecção, muita orientação. Tolerância e paciência.

Corremos o risco de exigir demais de ti por seres tão desperta e despachada mas tento sempre lembrar-me que ainda me cabes no colo.

E lá caberás mesmo quando já não couberes. Porque o meu colo será sempre teu.

imagem@weheartit

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MÃE DE UMA MENINA, É PARA E POR ELA QUE ESCREVE SEMANALMENTE, PASSANDO PARA PALAVRAS OS MAIORES SEGREDOS DO VERBO AMAR.

Autora orgulhosa dos livros Não Tenhas Medo e Conta Comigo, uma parceria Up To Kids com a editora Máquina de Voar, ilustrados por aRita, e de tantas outras palavras escritas carregadas de amor!

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