As crianças não vêem a síndrome de Down do meu filho. Os adulto sim
Se te perguntassem quem ou o que é que te deu a maior lição de vida até hoje, a resposta seria, provavelmente, um professor que foi uma grande inspiração, os tempos de faculdade, o ano que passaste a viajar, um melhor amigo, um adulto influente, um familiar muito querido ou os teus avós. Todas estas pessoas e experiências com certeza influenciaram a minha visão do mundo e, sem sombra de dúvidas, moldaram a pessoa em quem me tornei hoje.
Mas a maior aprendizagem na minha vida aconteceu nos últimos sete anos. O nascimento de meu primeiro filho, com um diagnóstico de Síndrome de Down, abriu-me completamente os horizontes.
Com esta experiência aprendi muito – sobre mim e os outros, sobre prioridades e igualdade. Mas foi o próprio Seb e as crianças à sua volta que mais me ensinaram sobre a vida.
Tenho lembranças tristes de quando fui informada de que meu filho tinha Síndrome de Down, tinha ele um dia de vida. Fiquei arrasada. A minha cabeça foi invadida pelo medo do que o futuro nos reservava e imaginei uma vida de exclusão e impotência, de isolamento, com ele a ser constantemente alvo de olhares e a sentir-se “diferente”.
Por um tempo acreditei que aquela dor nunca iria acabar. Naquele momento, o meu bebé não tinha apenas Síndrome de Down, ele era a Síndrome de Down. Eu associei-o a uma série de estereótipos e não consegui ver que, na verdade, ele era um bebé, e o meu bebé. Seb.
Aos poucos comecei a ficar mais tranquila à medida que me apaixonei pelo meu bebé. A cada dia que passava ele mostrava-me algo novo sobre si mesmo. Ele passou de um lindo bebé para uma criança adorável, ainda que às vezes desafiador – e depois tornou-se um rapaz – igualmente adorável (e igualmente desafiador).
Hoje em dia adora futebol e andar de skate, adora gelados e batatas fritas, mas odeia lavar o cabelo e ir para a cama. Aprendeu a ler e a escrever, ama ir ao cinema e brincar com seus amigos. A nossa vida em conjunto não poderia estar mais distante das perspectivas sombrias que eu tinha imaginado.
Mas infelizmente deparo-me, frequentemente, com os preconceitos de adultos bem intencionados. As pessoas dizem-me que “crianças como Seb” são amorosas, generosas ou dizem que o Seb tem “aquilo” mas é muito leve. E, se digo a alguém pela primeira vez que tenho um filho com Síndrome de Down, a reação mais comum é essa pessoa dizer “Ah!” com um desconforto palpável e, mais do que uma vez, seguido por “que pena”.
Mas com as crianças é diferente. Há uma inocência maravilhosa no olhar infantil. Elas vêem a pessoa, não a síndrome.
Seb frequenta uma escola comum. As crianças da escola não sabem que ele tem um “rótulo”. Não têm ideias pré-concebidas do que ele pode fazer e o que deveria fazer. Ele é apenas o Seb.
Se pedirmos para o descreverem, os amigos dizem que ele é bom a andar de skate, que ama futebol, que corre rápido ou que precisa de uma ajuda extra na escola. Se perguntassemos a mesma coisa aos pais destas crianças, acredito que “Síndrome de Down” estaria na primeira frase dita por eles.
Hoje o Seb tem dois irmãos mais novos, e eu nunca lhes disse que o mano tem Síndrome de Down. Quero que eles cresçam a ver o Seb como Seb. Não quero que ele seja rotulado ou que o tratem de forma especial.
Por isso, fiquei meio desconcertada quando o irmão de 4 anos de idade do Seb, do nada, diss-me: “Mãe, o Seb é engraçado a falar, não é?”. Eu não estava nada preparada para esta pergunta e tive que pensar rápido.
“Bem, sabes, alguns de nós são bons em algumas coisas, outros são bons em outras”, disse eu a ganhar tempo para a verdadeira explicação..
“Por exemplo, sabes como o Seb é bom a jogar futebol, e tu és bom a falar? Então, somos todos bons em coisas diferentes.“
“Ah, sim!”, respondeu animado. “Se calhar ele estava a falar espanhol. Ele é bom a espanhol!”
Mais nada. Aceitou esta explicação e não falou mais no assunto.
Quando fui informada do diagnóstico do Seb, adorava ter conseguido ver o mundo pelos olhos de uma criança.
A notícia teria tido muito menos impacto em mim, ou se calhar não me tinha afectado nada. Fico triste por ter desperdiçado aqueles primeiros dias preciosos com um medo tão desnecessário. O pânico que tomou conta de mim foi, sem dúvidas, fruto da minha ignorância.
Cresci numa época em que crianças (e adultos) com alguma deficiência de aprendizagem raramente eram vistas. Não me lembro de ter tido a oportunidade de falar ou de conhecer alguma pessoa com uma deficiência durante minha infância. Crianças com dificuldades de aprendizagem e deficiências em geral não eram vistas na escola, nas festas, no café, no campo de futebol ou no cinema.
De facto, as pessoas com deficiência ficavam segregados à sua própria comunidade. Eu nunca tive a chance de ver para além do rótulo que lhes era dado. E, no fim de contas, quando o meu filho foi diagnosticado com Síndrome de Down, fiquei arrasada e desconfortável com isso.
Envergonho-me disso até hoje, e provavelmente para sempre.
Por Caroline White, para BBC.com
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