
Os Exames Nacionais e as apostas nos filhos
Reparei que estava outra vez com aquela tosse nervosa. Olhava para o infinito. Dois sinais de que algo a preocupa bastante. Fiquei a olhá-la pensativa, o que é que se passa naquela cabecinha que ainda nem uma década tem? Antes de lhe poder perguntar alguma coisa, ela quebra o silêncio e fixa os olhos nos meus. -… e se eu tiver negativa, o que é que me acontece? Nunca valorizei ou fiz parte deste “movimento” excessivo relativo a estes meses anteriores aos exames nacionais. Agir com naturalidade é, a meu ver, uma boa maneira de descomplicar. É, é um exame, mas é tão importante como qualquer outro teste durante o ano lectivo. E ponto final! Se a coisa não correu bem o ano todo, não será agora que vai brilhar e vice-versa. Também não concordo com este “método” de não os chumbar. Não conseguiram aprender a matéria indicada e passam para o ano seguinte sem a saberem?
–Não acontece nada de especial querida!
-Não?!
-então porque é que haveria de acontecer alguma coisa de diferente?
-Mas a Mãe fica triste?
-Não querida, claro que não. Tu és aplicada, dás o teu melhor.
–São tantas páginas e só temos 90 minutos...
–O exame foi preparado de propósito para que fosse possível acabá-lo nesse tempo. Por isso não tens de te preocupar com isso.
-Ok!
Fui premiada com um sorriso aliviado. Sossego. Hoje em dia, a necessidade de que as crianças sejam os melhores a “tudo” ultrapassa, em larga escala, o limite do razoável. São como cavalos de corrida nos quais se aposta em grande: Escolas bem posicionadas no ranking nacional (só ouvi falar dos “rankings” há pouco tempo); conservatórios bem conceituados; aos 6 anos já são federados em qualquer coisa; andam em centros de explicações (mesmo quando não há necessidade disso). É bom que sejam bons alunos, mas não é obrigatório. Aliás, se o intuito é serem super-inteligentes, há que notar que os “maiores cérebros” não são/não foram alunos brilhantes. Não querendo comparar, mas comparando, com o meu tempo (é fácil cair nesta tentação), nós não éramos bons a tudo! Havia os que tinham mais jeito para as “letras” ou “matemáticas”, desporto e por aí fora. Mas acima de tudo, havia sempre tempo para brincadeira. Brincávamos imenso! Hoje em dia brincam no recreio (ainda no contexto escolar) e depois já não há mais tempo para brincar porque se metem as actividades e os estudos até ficarem esgotados. Quando chegam a casa, já só querem uma actividade na qual estejam sentados ( tablets, computadores, televisões e consolas). Não contentes ainda os pressionamos no que diz respeito aos exames (?). E quando crescerem, como é que vamos reagir quando nos apercebermos que são adultos infelizes e que nunca se souberam divertir? Que se continuam a esforçar imenso, e até sofrem com isso, para conseguirem ser bons a tudo em vez de se concentrarem naquilo em que são naturalmente bons? Como é que vamos reagir se só forem bons em profissões que não exijam uma formação superior? E quando concluirmos que andámos a apostar rios de dinheiro “no cavalo errado”? “No meu tempo” (e caio de novo na tentação) aprendíamos a ser crianças … porque essa é a aprendizagem que carregamos connosco a vida toda, que nos ensina a rir de nós próprios, que nos faz sentir uns jovens aos 80 e que nos ajuda a levar a vida de uma forma mais alegre e descontraída. Saber brincar é ter sempre um lado de criança dentro de nós, mas ser levado a sério mesmo quando passamos a vida a rir!
Imagem capa@asbeiras.pt/
Como pais e educadores, haverá alguma forma de andarmos um passo à frente dos nossos filhos? Será isso necessário? Como fazê-lo?
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Republico com imenso gosto. por que eu, ainda sou do tempo em que aprendíamos a brincar. E brincávamos com os brinquedos que nós próprios construíamos.