A importância de ouvir a pessoa com deficiência.
Não há livro de instruções para pais – menos ainda, para pais atípicos.
Muitas vezes, tantas vezes, antes de se entrar numa estrutura ou de chegar a cavalaria de apoio (vulgo, terapias), a sensação que se tem é que se está num labirinto e anda-se ali em experiências tentativa-e-erro. Às vezes, corre bem (e, como os ratinhos, fixamos essa estratégia para usar mais tarde); outras vezes, é um fracasso retumbante. Mas aprendemos na mesma, quanto mais não seja, a não repetir.
Esta aprendizagem também é válida para os nossos filhos atípicos.
Nada é programado e, daí, os timings e avaliações nas check lists de desenvolvimento porque, por vezes, o software traz um pequeno delay ou defeito. Daí que, mesmo em crianças típicas, a aprendizagem passe também pelo erro. Em crianças típicas mas também atípicas.
Não há livros de instruções nem receitas infalíveis.
Dentro do que for possível, e dependendo do grau de deficiência, o grande objetivo dos pais é educar e criar para a autonomia ou, na pior das hipóteses, encontrar uma solução viável e expectavelmente inclusiva para que, em adulto possa haver uma resposta digna para a pessoa com deficiência (esse assunto ficará para uma outra altura). E, em alguns casos, isso pode passar por começar por ouvir a pessoa com deficiência. Mas ouvir mesmo.
A importância de ouvir a pessoa com deficiência
Perceber quais são os seus pontos fortes, as suas aptidões, de que é capaz, que pode fazer mais tarde, onde pode ser integrada para estudar ou trabalhar ou ser quem é, como pode ser incluída na sociedade à qual pertence por direito, que opções fiáveis há, etc. Não é despachar o assunto com duas ou três conversas com um assistente ou psicólogo escolar e encher cursos vocacionais ou profissionais ou qualificas por causa de financiamentos e estatísticas (não é geral mas esta realidade existe); é perceber MESMO qual o passo seguinte a tomar.
A nossa realidade familiar passa por aí.
Não impusemos condições nem seguimentos tradicionais e nunca optámos pelo facilitismo. As piolhas são membros da família, são pessoas plenas com ideias, sonhos, ambições, desejos. Faz perfeitamente todo o sentido que sejam elas a ponderar e a escolher o que pretendem seguir ou fazer. Ou até ter dúvidas em relação a isso ou não saber o que fazer.
Foram ouvidas, aconselhadas pelos pais e por profissionais, conheceram antecipadamente o local escolhido, as condições do curso, ficaram indecisas, mudaram de ideias, estudaram mais um pouco, decidiram e apostaram. Tem corrido bem. E se corresse mal? Não haveria problema. Mudar-se-ia o rumo, o foco, ajustar-nos-íamos e recomeçaríamos. Há tempo. Esta geração é jovem, é relativamente instruída e tem tempo. Porque antes dos 18 anos, salvo raras exceções e sem abandono escolar, não podem ir trabalhar e descontar, logo, há que aproveitar o tempo na escola para fazer o que se espera: estudar, crescer, aprender, amadurecer.
Qualidade de vida
Sou adepta da qualidade de vida. E, se para isso, são precisos apoios extra, serão bem-vindos. Não sabemos o que o futuro nos reserva e já só faltam 3 anos para a maioridade mas sabemos que podemos já ir preparando o terreno para algumas coisas, ir treinando a autonomia e independência o máximo que pudermos e elas aceitem, que recorrer a um psicólogo/terapeuta/técnico especializado de alguma coisa é perfeitamente legítimo, que há outras possibilidades em aberto, que estaremos sempre cá para elas e que nem tudo tem de vir no timing que os outros esperam que venha (tirando as contas para pagar, vá). A vida delas – o ritmo delas – as escolhas delas – as aprendizagens delas (mesmo que lhes valham umas boas cabeçadas) – elas.
Porque elas têm um lugar. E isso ninguém (lhes) pode negar.
O esforço de manter uma vida normal em tempos difíceis, a vários níveis… Em suma, uma aventura vivida a 4.