
Pais de filhos com necessidades específicas são das pessoas mais tolerantes que existem
As mães e pais de filhos com necessidades específicas são das pessoas mais tolerantes que existem.
Os seus filhos com necessidades específicas têm níveis de tolerância díspares a quem ninguém dá importância a menos que estejam na escola e não cumpram com o expectável normalizado e padronizado. Por exemplo, se tiverem um meltdown por sobrecarga de estímulos, virá seguramente uma queixa por causa do comportamento disruptivo e não uma explicação para a causa desse comportamento.
A esses pais e a esses filhos tudo parece ser exigido.
É-lhes exigido que sejam pais e acumulem a função de cuidadores (de que escreverei em breve) sem queixas e, preferencialmente, sem exigir demasiados apoios na segurança social. Pasmemo-nos ou não, mas, a verdade é que ainda há muitas famílias com crianças com necessidades específicas que desconhecem que têm DIREITO a uma bonificação por deficiência porque, pura e simplesmente, ninguém os informou da existência de tal apoio.
É-lhes exigido um estoicismo tal que não se pede a pais típicos. Nem a crianças típicas.
É-lhes exigido que sejam como os outros mas sem noção dessas exigências: se a mãe – tradicionalmente, sobre quem acaba por recair a função da cuidadora – trabalha pode ser criticada porque ousa dedicar parte do seu tempo a outra função que não cuidar do seu filho com deficiência; se a mãe não trabalha pode ser criticada porque prefere ficar em casa e, afinal, que faz ela quando o filho está nas terapias ou na escola; mas se trabalha a meio tempo é uma indecisa porque nem pode dedicar-se totalmente ao trabalho nem ao filho com deficiência; se faz assim ou assado poderá ser sempre criticada. Será sempre criticada.
É preciso tempo e uma dedicação imensurável para acompanhar um filho com determinadas condições específicas.
Sabiam que há crianças que são seguidas em mais de 10 (sim, dez!) especialidades e têm horários de terapias e consultas mais rígidos que muitos trabalhadores? Que há crianças – e nas quais ainda se incluem as piolhas – que trabalham adicionalmente uma média de 5 a 10 horas extra por semana? Sabiam que no 1º ciclo, o horário de uma criança com necessidades específicas, juntando tudo de que precisa, pode perfeitamente e com facilidade chegar às 40h semanais? É preciso tempo e uma dedicação imensurável. E não precisamos de julgamentos das nossas ações, especialmente quando se desconhece toda uma engrenagem por detrás que permite que aquela criança com necessidades específicas possa desenvolver-se e evoluir.
As exigências a uns e a outros não são equitativas.
Noto, a nível pessoal, que, por haver um diagnóstico e respetivos documentos de promoção do sucesso escolar, há muito pouca margem para falhas, o nível de exigência é muito maior, a tolerância baixa. Um aluno neurotípico pode ter determinados comportamentos que não são tolerados num aluno atípico. Até consigo perceber o porquê mas não consigo aceitar. Tal como não posso aceitar que, a nós pais atípicos, seja exigido o mesmo que a outros e o façamos de cara alegre. Não pretendemos retirar direitos a ninguém, apenas fazer valer os nossos.
Se a lei em vigor me permite fixar horário, por que não poderei fazê-lo sem penalização ou julgamento de colegas e superiores? Se a lei em vigor me permite uma licença por x tempo, por que serei criticada por essa opção? E se a lei em vigor, mesmo que não seja o mais indicado a longo prazo, me permite concorrer e aceita horários incompletos no sistema educativo, por que hei ser criticada por colegas por não concorrer a horários completos a nível nacional? Há um ditado que envolve pimenta e um açucareiro. É um pouco isso.
As mães (e pais!) de filhos com necessidades específicas são das pessoas mais tolerantes que existem. Mas até essa tolerância tem limites.
O esforço de manter uma vida normal em tempos difíceis, a vários níveis… Em suma, uma aventura vivida a 4.
já conheço bem T2 para 4, por isso identifico-me muito bem nesta realidade, nesta escrita, neste contexto…
Obrigada!
Olá Sofia, acredito que sim! Espero que esteja tudo bem convosco. Um beijinho