
Saberemos nós lidar com a depressão dos que nos rodeiam?
A depressão dos que nos rodeiam.
Não tenho nem ligo a redes sociais, fruto de sentir que o impacto muitas vezes era negativo e algo que trazia poucas coisas significativas à minha vida.
Ainda assim e por questões profissionais giro uma conta ligada ao livro que editei no ano passado. Por este motivo “sigo” e sou “seguida” por pessoas um pouco por todo o mundo e tenho acesso a alguma realidades que me são muito importantes para o domínio da escrita e para a forma como falo sobre a realidade e as emoções.
Ultimamente tenho vindo a aperceber-me que existem várias pessoas (a faixa etária encontra-se entre os 19 e os 30 anos) que lutam diariamente com doenças como a depressão. São pessoas que usam estas redes sociais. Muitas vezes sob o anonimato de contas com uma vertente profissional, para veicular o que sentem e o que lhes passa pela cabeça. E tenho vindo a entrar em contacto com a maior parte delas.
Só esta semana e recorrendo aos stories, por terem uma duração inferior a vinte e quatro horas – o que faz com que o que é partilhado desapareça depois desse tempo – vi pedidos de ajuda camuflados, jovens a falar sobre o desespero que sentem em estarem vivos, o julgamento e pressão que sofrem quando se abrem sobre a doença que têm, a falarem sobre a possibilidade de se suicidarem.
Como mãe (e como ser humano) sou incapaz de seguir a minha vida sem estender a minha mão (virtual, é certo). Porque as redes sociais servem também para isto.
Para que as pessoas sintam que não estão sozinhas, por mais abandonadas e isoladas que se sintam.
Esta geração é muitas vezes julgada por se considerar que não há motivos para tamanha tristeza, porque é uma geração privilegiada, que tem muito mais do que a que os seus pais alguma vez sonhou ter. O pensamento é basicamente “tens uma vida tão boa, por que é que hás-de estar tão triste?”. Li algures que para alguém que está a sofrer de depressão este tipo de comentário é como perguntar a um asmático “se há oxigénio por todo o lado por que raio não consegues respirar em condições?”.
Fala-se também de a depressão ser uma doença de “gente rica”. Que os pobres não têm tempo para ficar a deprimir e isso é algo injusto para os dois lados do expectro. Simplesmente há quem tenha maior possibilidade de pedir ajuda e quem tenha de encontrar formas de funcionar mesmo quando está apenas em piloto automático.
As pessoas que falaram em suicídio mostraram reservas pelos que ficam como sendo um dos maiores motivos para não seguirem em frente. O que em si é de um peso enorme também.
Às vezes vou no metro e dou por mim a pensar que não sabemos realmente nada uns sobre os outros. Só sabemos o que as pessoas partilham, o que escolhem partilhar.
Porque por trás de uma pessoa sorridente, constantemente bem disposta pode estar alguém a passar por uma batalha interna imensa.
E por isso considero que devemos ser sempre gentis, em todas as circunstâncias.
Há famílias que perderam entes queridos e que vivem com a culpa de não ter conseguido antecipar, evitar o que aconteceu. Muitas vezes não há pistas.
Mas muitas vezes elas estão lá.
Temos, algumas vezes sem maldade, a tendência de desvalorizar os sentimentos dos outros. Inclusivamente por querermos que ultrapassem o que estão a sentir.
Acredito que temos de abrir os braços. Fazer chegar às pessoas que nos rodeiam a ideia que são importantes mesmo que não se sintam assim. Que têm um lugar neste mundo, mesmo que o caminho pareça turvo e haja pouca expectativa ou ausência de sonhos. Temos de deixar as pessoas chorar (é tempo de deixar de lado o constrangimento e dizer que faz parte). Temos de aceitar que não vemos todos o mundo da mesma forma, não sentimos a dor da mesma maneira, não temos todos as mesmas ferramentas para lidar com os problemas.
E temos de perceber que muitas vezes não existe “a” razão. Simplesmente a pessoa sente o que sente e ponto final. E isso não deve ser desvalorizado nem relegado para segundo plano porque “devias ver o que é ter problemas a sério”.
Como humanos temos a sorte de ter vindo a desenvolver uma série de competências sociais que nos permitem viver em comunidade. O que nos falta aprender é olhar em volta e perceber como somos todos tão diferentes. Todos capazes de sentir coisas tão profundas que nos fazem pôr em causa a nossa existência.
Como mãe espero que a minha filha seja sempre feliz.
Que encontre sempre formas de ver o copo meio cheio e não meio vazio. Que saiba que pode estar triste, sentar-se ao meu lado e simplesmente estar em silêncio se não quiser falar. Que estou ali para a ouvir se me escolher como receptora das suas verdades. Que mesmo que um dia se sinta desesperada saiba que estou aqui. E que farei o meu melhor para a compreender, mesmo que ela própria possa não conseguir fazê-lo.
A todos os que estão a passar um mau bocado: vai passar, às vezes só é preciso continuar a remar.
A todos os outros que remam sem se aperceberem do esforço que isso requer. Olhemos em volta, ajudemos a remar quem precisa.
image@weheartit
Autora orgulhosa dos livros Não Tenhas Medo e Conta Comigo, uma parceria Up To Kids com a editora Máquina de Voar, ilustrados por aRita, e de tantas outras palavras escritas carregadas de amor!
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